[Relato de Parto] Nascimento da Manoa - Mariana Crivilin - Parto Domiciliar Planejado
"O meu relato de parto não pode ser contado sem o caminho que foi percorrido até ele. Então,
comecemos pelo início. Ele é longo, pois a minha história não é tão simples. Espero que possa
mudar o caminho de alguém, pois o meu mudou depois de ler relatos como esse.
MINHA CAMINHADA

Dia 16 de janeiro de 2015 foi o dia em que descobri minha gravidez com um exame de sangue,
após dois testes negativos de farmácia. Estava com seis semanas de gestação. Àquela época
sobre o parto eu apenas sabia que queria normal. Na realidade, desde sempre quando
pensava em filho nunca passou pela minha cabeça outra opção que não fosse essa.
Nesse mesmo dia encontrei uma amiga, Bruna Bolonha, e ela me disse para contratar uma
doula. Eu perguntei: o que é uma doula? E ela me respondeu que era uma mulher que
auxiliava no parto. Achei que não fosse precisar de uma e deixei aquela idéia passar, dando
prioridade a outras coisas.
Lembro-me de estar viajando e alguns dias depois, quando retornei ao Rio, minha primeira
atitude foi como a da maioria das mulheres: peguei a lista das GOs do plano de saúde e
marquei várias, para saber qual eu teria mais empatia.
E assim foi... Fui a uma, duas, três, quatro médicas e não conseguia me identificar com
nenhuma delas. Eu entrava no consultório, era atendida em 15 minutos, e quando falava sobre
o meu desejo de ter o parto normal, sempre ouvia: Se for possível, né? Nem sempre é.
Aquilo me trazia uma insegurança profunda. Busquei em minha memória todas as mulheres
amigas e conhecidas que já haviam tido filho antes de mim e finalmente me dei conta de que,
embora todas quisessem também a via de parto vaginal, nenhuma delas conseguiu. Sempre
havia algum impedimento, como estava perdendo liquido, cordão estava enrolado no pescoço,
passou do tempo, o neném era muito grande etc. Questionei-me se o problema estava nelas,
se era coincidência ninguém ao meu redor ter conseguido ou se havia alguma coisa errada
nisso tudo. Devaneio da minha parte, pensei, resolvi deixar pra lá.
Minha caminhada continuou. Os meses passaram e eu ainda não tinha encontrado quem faria
meu pré-natal. Já estava na sexta médica e ainda mais insegura.
Na minha inocência e até mesmo ignorância, achei que o fato de não um ter um
acompanhamento decente ainda não era um grande problema. Afinal, eu ainda tinha uma
série de coisas importantes pra me preocupar, como o enxoval, o quarto do bebê, o chá de
bebê, as fotos da barriga. E o parto, ah, o parto, esse eu podia pensar depois, afinal, seria
normal e no hospital, não havia dúvida, só faltava escolher o profissional.
Doce inocência... Mal sabia que nada disso importa e que a primeira decisão da mulher deve
ser quanto ao parto e a equipe que irá acompanhá-la nessa estrada.
No quinto mês de gestação fui à sétima médica do plano, esta havia sido indicada pela sexta
médica que me atendeu e me dispensou porque também estava grávida. Pela primeira vez
entrei em consultório e fui bem atendida. A primeira impressão foi maravilhosa, a consulta
durou mais que 15 minutos, conversamos sobre vários assuntos, a médica era uma fofa e
(aparentemente) a favor do parto normal. Fiquei muito feliz! Sai de lá com um riso de orelha a
orelha pensando: encontrei minha médica. A próxima consulta já estava marcada e eu a
indiquei para uma amiga que também estava grávida.

Nesse momento eu estudava muito listas de enxoval. Precisava saber cada item que iria
precisar quando minha filha nascesse. Fui pra Miami, minha nova médica tinha me autorizado.
Trouxe de lá as melhores mamadeiras, os melhores bicos, berço portátil, concha para seios,
uma infinidade de pomadas para tudo quanto é problema, e tudo mais que você possa
imaginar. Achei que aquilo ali seria a realização máxima da minha gravidez, passar 10 dias em
Miami comprando. Mas eu não sabia nada. Não sabia nada sobre parto, não sabia nada
amamentação, não sabia nada sobre puerpério, muito menos sobre a real necessidade de um
bebê. No entanto, aquilo me bastava.
Por incrível que possa parecer, e quem me conhece sabe, sou uma pessoa bem informada.
Sempre tive acesso a boas informações e sempre fui crítica. Só que, para mim, o parto era algo
tão óbvio que eu não precisava parar para pensar nele. Eu não tinha idéia como estava a
realidade obstetrícia brasileira. Ninguém ao meu redor tinha, com exceção de uma amiga -
falarei dela mais a frente.
Voltando ao assunto da médica fofinha, fui ao segundo encontro. Esse foi diferente. Quando
conversamos novamente sobre parto a conversa foi outra. Em primeiro lugar ela me disse que
não poderia esperar eu entrar em trabalho de parto se eu passe das 40 semanas. Depois, me
falou que, ainda que eu entrasse em trabalho de parto no tempo certo (determinado por ela),
ela não me deixaria horas sofrendo (isso mesmo, SOFRENDO) apenas (APENAS) para ter um
parto normal. Ah, e por último, me disse que a barriga havia crescido muito e que o meu bebê
era bem grande. Passou-me uns exames, entre eles a ultrassom com doppler – que fui saber
depois ser totalmente desnecessário para gestação de baixo risco, como a minha, pois só
servia para achar problema onde não havia -, e deixamos a próxima consulta já marcada.
Saí de lá com medo, insegura, descrente do meu corpo e do meu poder como mulher e
mamífera. Meu castelo havia desmoronado. Já tinha passado o sexto mês, eu não agüentava
mais trocar de médico e nem podia, afinal a família já pressionava para saber qual hospital eu
iria parir. Achei que não havia mais tempo para outra mudança e deveria me conformar com a
médica.
No meio desse turbilhão, uma amiga (que não era tão amiga assim, mas se reaproximou por
conta da gravidez simultânea), Kallige, me chamou no whatsapp para uma conversa
despretensiosa. Questionou-me várias coisas: o que eu pensava para o meu parto; se já tinha
feito plano de parto; se estava confiante; se tinha doula; se tinha lido sobre meus direitos etc.
Respondi que faria parto normal e ponto final. Ela prosseguiu: mas sua médica faz mesmo
parto normal? você está certa disso? Leia sobre relatos de parto na internet, nunca é tarde
para mudar, tem mulheres que mudam tudo com 38 semanas. O parto dela seria humanizado
domiciliar.
Eu, em um primeiro momento, senti raiva. Pensei: como assim ela ta duvidando da minha
médica e do meu parto normal? É óbvio que eu ia conseguir e que a minha médica, tão fofa,
iria me ajudar nisso. Passado algum tempo, refleti. Fiz o que deveria ter feito desde o primeiro
minuto que descobri minha gravidez. Fui para a internet buscar informação. Descobri um
mundo de coisas que eu não fazia idéia, li inúmeros relatos parecidos com o que vinha
acontecendo comigo e uma série de mulheres que se empoderaram e tiveram coragem de
mudar, mesmo no final da gestação.
Sentei na cama com meu marido e comecei a chorar. Contei a ele tudo que estava se passando
e da minha frustração. Falei das informações novas e que queria começar tudo de novo. Era o
sétimo mês de gestação. Ele olhou pra mim e disse: meu amor, eu estou com você. O que você
quiser fazer eu apoio. E o apoio dele foi fundamental nessa mudança.
A MUDANÇA – MEU ENCONTRO

No outro dia cedo, sentei no computador de novo e comecei a pesquisar. Pelo que tinha lido, o
primeiro passo seria contratar uma doula. Não hesitei. Tive a mesma conversa com a minha
mãe e ela também me apoiou, disse que pagaria a doula pra mim se fosse fazer com que eu
me sentisse mais segura.
Pela internet cheguei até a Aline Amorim. Marcamos um encontro para conversar e, talvez,
assinar um contrato. De cara, Aline chegou à minha vida me dando um choque de realidade.
Perguntou-me sobre quem era minha médica e onde seria o parto, e logo me respondeu, com
essas palavras: sobre a sua médica, nunca ouvi falar, então muito provavelmente ela deve
acompanhar aqueles partos de mulheres que chegam parindo e ainda assim com aquele
pacote completo de intervenções e na São José nós temos quase 100% de cesarianas do total
de nascimentos. Qual o seu plano de saúde? Você já consultou as taxas da sua médica e da
maternidade onde deseja parir no seu plano?
Sim, as taxas de cesárea da minha médica ultrapassavam 95% e as do Hospital São José 98%.
Que choque! Eu estava indo pro açougue e não fazia a mínima idéia. Fiquei completamente
perdida, e perguntei a Aline: e agora? o que eu faço?
Ela me disse: o primeiro passo para um parto respeitoso é ter uma equipe que respeita a
mulher e que não intervém desnecessariamente. Você tem três opções: fazer um parto
hospitalar privado, parto domiciliar ou o SUS. A mulher tem que parir no local onde ela se sinta
mais segura, descubra qual é esse lugar pra você.

Eu iria ter que começar do zero, encontrar um novo GO que me aceitasse no final da gestação
e mudar todos os planos até então feitos. Era a segunda quinzena do sétimo mês. Das opções
que a Aline me apresentou, eu de imediato disse a ela que o parto domiciliar seria a última
delas, porque, na minha concepção, não poderia existir parto sem médico e sem infraestrutura
hospitalar. Isso era um sinal de que eu ainda tinha estudado pouco sobre parto. Aline me disse
que os partos domiciliares eram tão seguros quanto os hospitalares para gestações de risco
habitual e me orientou a estudar a respeito. Me indicou inúmeras leituras.
O SUS deixou de ser uma opção porque a Maternidade que realizava o parto humanizado
estava passando por alguns problemas de gestão e nela passaram a atuar também equipes não
humanizadas, eu teria que dar a sorte de pegar um plantão com uma equipe boa. Então, eu
não poderia contar com o acaso.
Fechamos o contrato e aí que de fato começou a minha imersão no mundo humanizado. Aline
me inseriu em um grupo criado por ela com todas as mulheres que ela já acompanhou e
acompanha, chamado #GostamosDeParir. Caí de paraquedas no meio das ativistas, que me
acolheram sem nem mesmo me conhecer e me afoguei em meio a tanta informação e
experiência. Quanto mais eu sabia, mais eu queria saber. Tudo mudou pra mim. Muito embora
eu, aos sete meses, estava sem médico e sem saber como seria meu parto, me sentia leve e
acolhida. Passei a acreditar que eu podia sim parir, passei a acreditar no meu corpo, passei a
acreditar que meu bebê também saberia nascer na hora certa. A sensação era de ter tirado um
fardo das minhas costas.

Naquela semana eu tinha uma consulta com a médica que vinha me consultando. Não fui e
nunca mais voltei lá, eu era tão importante que ela também nunca me procurou para saber o
por que.
No meu dilema pela escolha do parto, por via das dúvidas, resolvi marcar uma consulta com a
enfermeira obstetra e uma consulta com uma médica, ambas do meio humanizado e que me
foram muito recomendadas. Estava com 35 semanas e ambas só aceitaram me receber em
estado tão adiantado de gravidez a pedido da Aline.
Nesse período eu estudava o dia inteiro sobre parto, só parava para comer, fazer meus
exercícios de pilates e yoga e para dormir.
Atravessando a rua, cai e torci o pé. Tive que ir ao hospital avaliar. Cheguei à emergência e fui
submetida a todos aqueles protocolos hospitalares, tive que me locomover em uma cadeira de
rodas, tive que lidar com pessoas que eu nunca tinha visto me examinando etc. Não tive nada
grave, mas esse incidente serviu para me mostrar que o último lugar onde eu estaria à vontade
e me sentiria mais segura para parir seria no hospital. Desde então eu só consegui me imaginar
parindo no seio do meu lar. Estar na minha casa quando o momento chegasse era o que eu
mais queria. Usar meu quarto, minha cama, minha rede, meu banheiro, estar em contato com
o meu cachorro, receber a minha filha no mesmo lugar onde ela foi concebida passou a ser,
para mim, fundamental.
Percebi, então, que não havia mais sentido na minha consulta com a médica. Desmarquei-a e
fui encontrar a enfermeira obstetra com 35 semanas, a Marcella Pereira. Não havia mais
dúvidas, agora era só esperar a hora e aproveitar o final da gestação.
A mudança de planos não foi contada a ninguém. Somente eu, meu marido e nossa equipe
sabiam como seria o parto. A família continuava a esperar a ligação para ir para a maternidade
ver a Manoa assim que ela nascesse. Optamos por não contar, pois além de essa decisão só
dizer respeito a mim e a ele, não queríamos compartilhar com quem não fosse concordar com
nossa decisão, somente serviria para nos estressar e não mudaríamos de idéia de novo para
agradar ninguém.
Tudo acertado, fui viver a vida. Preparei a casa para o parto com velas, incensos, luzes. Deixei
sempre a dispensa abastecida com comida. Fiz uma playlist com 13 horas de músicas que eu
amo. Frequentei o pilates e a yoga até o último dia útil antes de parir. Não deixei de ir à pós
graduação. Fui muito à praia, enfim... Esperei a hora que a Manoa queria vir ao mundo.
O PARTO

Acordei no domingo, dia 13/09/15 e fui ao banheiro. Tinha algo na minha calcinha que parecia
o tampão mucoso. Estava com 40 semanas e dois dias. Tirei uma foto e mandei para minha
doula e para minha EO. Ambas disseram que parecia ser sim o tampão mucoso. Lembro-me de
perguntar à Marcella: o que isso quer dizer? Eu queria ouvir algo de que o momento estava
perto, mas ela me respondeu: nada. Aline me mandou também ir viver a vida e esquecer
aquilo. Eu sentia que o momento estava perto, só não sabia quando.
Chamei o Caio, nos arrumamos e fomos pra rua. Nesse dia caminhei do Leblon ao Arpoador e
do Arpoador ao Leblon de novo. Ficamos ali admirando o visual e curtindo o dia com nosso
cachorro. Depois fomos fazer inúmeras coisas que eu não me lembro mais, só lembro-me de
chegar em casa quase 22h. Apagamos.
A partir de 1h da manhã me lembro de começar a sentir um incomodo que vinha e ia embora,
de tempos e tempos. Primeiramente achei que era da posição, e sempre que a dor vinha eu
mudava de lado. 5h da manhã me dei conta de que não conseguiria mais dormir, me dei conta
de que aquilo pareciam contrações. Desisti de tentar dormir e levantei. Fui ao banheiro. Tinha
sangue na calcinha. Acordei o Caio e disse: acho que chegou a nossa hora, amor. É hoje!
As contrações até então vinham de tempos em tempos. Eu não contei as contrações, mas
acredito que vinham de 30 em 30 minutos aproximadamente. Mais uma vez resolvi seguir a
vida e não me apegar a isso.
Dia 14/09/15 era o dia da minha cerimônia na OAB/RJ. Minha carteira que era da OAB/ES e
que eu havia aplicado vários meses antes para tirar no Rio e que demorou tanto para sair,
finalmente ia pegá-la. Mas tinham as contrações indo e vindo, tinha sangue também saindo
cada vez mais. Falei com a Marcella e com a Aline se seria muita loucura da minha parte ir lá
buscar, elas me disseram que não, que o trabalho de parto poderia engrenar ou não e caso
apertasse, eu voltava pra casa.
Eu fui. Cheguei na OAB 10:30h, depois de quase 1h no carro até lá. No minuto que eu pisei na
OAB e subi no salto para ir para a cerimônia, o trabalho de parto engrenou. As contrações
começaram a vir a cada 5 minutos. Eu já estava ali e não iria embora sem minha carteira. Subi
o andar, entrei na fila e quando a secretária me atendeu eu pedi prioridade. Ela me disse que
não havia prioridade e me perguntou por que motivo, eu disse que havia acabado de entrar
em trabalho de parto. Foi um desespero total. As contrações já vinham com tudo, eu já tinha
dificuldade de ficar me comunicando e me escorava no Caio para andar. Alguns minutos
depois o Presidente me recebeu no gabinete dele, eu fiz o juramento, peguei minha carteira e
fui embora. Todos me desejaram boa sorte e me mandaram correr. Botei minhas havaianas.
Entramos no carro e fomos para casa, mais 1h até em casa pelo menos. Eu já não conseguia
mais falar, Caio ligou para Aline e Marcella enquanto dirigia e elas pediram para ele contar
minhas contrações. Elas vinham a cada 2 minutos. As meninas disseram então que iriam lá
para casa também.

Cheguei em casa por volta de 12h. Logo depois a Marcella e a Paolla chegaram, recebi-as com
um vômito imenso. Algum tempo depois chegou a Ale Rocha, fotógrafa que eu escolhi para
partilhar comigo e registrar aquele momento. Por fim, chegou a Aline. Minha equipe agora
estava completa. Eu me sentia segura, acolhida e não tinha o menor pudor ou vergonha com
ninguém que estava ali. Eu quis que elas estivessem ali. Agora era só se entregar e deixar a dor
vir, porque ela que iria trazer minha filha ao mundo.

Daí em diante posso contar muito pouco. Entrei em uma viagem muito louca e só acordei
quando a Manoa veio ao mundo. Eu fiquei completamente entregue ao que estava vivendo,
embriagada pelos hormônios que atuavam em mim. Sei que senti muita dor, perdi muito
sangue, evacuei muito e não havia posição que confortasse. O que me marcou foi uma pressão
grande no ânus que só parecia vontade de fazer côco, mas não era. Usei chuveiro, usei
banheira, usei bola de pilates, recebi massagem. Amenizava, mas nada resolvia. Era muita dor.

Quando eu conseguia falar alguma coisa eu sempre pedia para desistir. Implorava para ir para
o hospital tomar anestesia. Dizia que estava com algum problema e que ela não queria nascer.
Não tinha a menor noção temporal, mas me dei conta de que haviam passado muitas horas
quando, primeiro, anoiteceu, e, segundo, minha playlist de 13 horas de música havia acabado.
Ali eu fiquei abalada, vi que minha caminhada já se arrastava há muitas horas e pelo visto
ainda estava longe, pois a bolsa nem rompido ainda tinha.

Tudo que eu mais queria era que aquela dor parasse por um tempo. Queria muito uma
anestesia. Ninguém me levou ao hospital porque sabiam que, no fundo, não era o que eu
queria. Eu escolhi assim: um processo 100% natural e fisiológico. Além disso, tudo corria bem.
Manoa era monitorada de tempos em tempos e seus batimentos eram bons, não havia sentido
em desistir depois de tantas horas.

Recordo-me de retomar a consciência, me colocar no presente momento e no que estava
vivendo e no porque daquilo tudo sempre que olhava para as mãos da minha doula, enquanto
apertava-as com toda minha força. Ela trazia no pulso uma pulseira com a frase TRUST BIRTH.
Era exatamente aquilo que eu precisava ler. Eu precisava acreditar em mim, acreditar no meu
corpo e acreditar no meu bebê. Eu sabia parir e ela sabia nascer.
Não sei em que momento eu fiquei muito mal, chorei e disse que não agüentava mais aquilo.
Disse que estava com algum problema e que aquilo ainda se arrastaria por horas e eu estava
farta. Elas me disseram que estava perto e eu disse que era mentira. Aline me falou para
colocar a mão na minha vagina e ver o que eu sentia. Eu coloquei, e com a distancia de uma
unha adentro eu sentia algo. Eu não queria acreditar, mas sim, era ela mais perto do que eu
imaginava. Aquela foi a força que eu precisava para continuar.

Um tempo depois, a bolsa estourou. Agora sim, estava chegando. As contrações aumentaram
de intensidade. Foi-me oferecido entrar na banheira, mas a banheira me relaxava tanto que as
contrações diminuíam, achei que aquilo podia me prejudicar. Sai da banheira e fui ficar de
cócoras, a posição que tanto treinei na yoga e tanto li dos benefícios.

Não sei quanto tempo tive de expulsivo, umas 2h talvez. Mas sei que quando a vontade de
fazer força veio foram apenas 3 puxos. A música que eu pedi, Reconhecimento - Isadora Canto,
tocou durante o nascimento da minha filha, a mesma que eu colocava para ela ouvir quase
todos os dias quando ainda estava na barriga. O ambiente estava do jeito que eu queria para
recebê-la: escuro, aquecido, vela com cheiro acesa, música rolando, ocitocina no ar e muito,
muito acolhimento. Ela nasceu e veio imediatamente aos meus braços, cheia de mecônio,
sangue e praticamente sem nenhum vêrnix. Eu só sabia dizer: nós conseguimos, filha, nós
conseguimos... Ela quase não chorou e ficamos ali nos olhando fixamente, pele a pele, olho no
olho, seios à disposição dela para quando quisesse.

A placenta saiu quase 1h depois. Manoa permaneceu ligada a ela até que todo o sangue fosse
absorvido e o cordão umbilical ficasse seco. O pai cortou o cordão e a placenta nós guardamos.
Bebê com 3,230kg, 51,5cm e Apgar 10/10. Em mim laceração de 2º grau que optamos por não
suturar. Não houve nenhum tipo de intervenção em nenhuma de nós, nem mesmo exame de
toque durante o trabalho de parto.
Eu sei que senti muita dor, mas já não me lembro. Sei que faria tudo exatamente igual.
No exame que se faz após o nascimento do bebê (capurro), constatou-se que Manoa tinha, na
realidade, 38 semanas exatas. Moral de história: se eu tivesse ido pra cesariana agendada com
38 semanas – quando os médicos te dizem que o bebê está pronto para nascer -, Manoa teria
36 semanas e seria prematura, poderia ficar internada.
Aquela minha amiga, para quem indiquei a médica fofinha, foi para uma cesárea agendada.
Essa foi a nossa história.

Meu muito obrigada...
- Caio, meu amor, que me apoiou e me acompanhou em cada passo dessa louca caminhada. Se
talvez, quando te chamei para conversar e mudar os planos, você não tivesse me apoiado
tanto, nada disso teria acontecido;
- Aline, minha doula, responsável pelo meu processo de empoderamento, pelas minhas
mudanças, por me encorajar e me fazer acreditar que tudo seria possível, mesmo aos 45 do
segundo tempo, por não sair do meu lado em todo o parto e por não se queixar mesmo
quando apertava sua mão até quase quebrar os seus dedos. E por, acima de tudo, me inserir
em um caminho de informação e conhecimento que não tem volta;
- Marcella Pereira, minha EO, que aceitou me acompanhar a partir de 35 semanas, que se
manteve paciente e acolhedora nas minhas 18 horas de trabalho de parto, que amparou
minha filha para que ela nascesse, que respeitou todas as minhas vontades e seguiu conosco
no pós-parto tão atenciosamente;
- Paolla Dulfe, EO auxiliar, por ser tão meiga e delicada comigo e com a minha filha durante e
após o parto;
- Alê Rocha, que surgiu como fotógrafa e se tornou amiga, que eternizou esse momento tão
lindo;
- Minha mãe, que me apoiou mesmo sem saber direito qual caminho eu havia escolhido;
- Kallige, você me fez repensar tudo e mudar de idéia;
- As índias do #GostamosDeParir, que mudaram e mudam meus conceitos, que me acolheram,
que me ensinaram o significado de maternagem consciente, que me introduziram na criação
com apego, que auxiliam nas minhas dúvidas diárias, que me empoderaram tanto para o parto
e lotaram a minha casa cheia de boas energias em um chá de bênçãos antes do parto."
Fotos por: Alê Rocha Fotografia
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